Leo Caobelli: Direção, produção, edição e roteiro.
Egle Saka: Edição e VFX analógicos.
Carlos Ferreira: Trilha Sonora, mixagem e masterização.
Paula Rebellato: Trilha Sonora.
Fu_k the Zeitgeist: Trilha Sonora
Liguei um antigo aparelho de TV que ganhei: “tic”, o botão que liga o aparelho é girado em movimento horário e produz esse pequeno barulho, logo depois de ter oferecido uma pequena resistência ao giro. Na sequência o som: um chiado contínuo, “white noise” como chamado na linguagem técnica. Ruído de estática, um som sempre presente, perfeito para checagem e monitoração de áudio em palcos, e – ironicamente – também usado para acalmar bebês e prolongar seu sono, já que lembram uma outra espécie de “ruído ancestral”, o útero materno.
A imagem vem depois, com um atraso enquanto esquenta o tubo e se projeta uma imagem. Ruído, chuvisco, uma série de pontos preto e branco se alternam na tela de 17 polegadas, se intensificam ou dissipam enquanto altero seus controles de brilho e contraste. Ao tentar sintonizar algo pelo “dial”, ou movendo o par de antenas VHF/UHF, o máximo que se capta são ondas de rádio. Bem ao fundo se pode perceber o resíduo de alguma transmissão AM, ao que os pontos na tela alternam seus movimentos acompanhando de alguma maneira o sinal que a TV recebe.
Meu primeiro reflexo é pensar em como poderia sintonizar um canal AV (áudio vídeo) nessa TV, para que ela pudesse receber uma entrada de imagem. Checo por alguma entrada externa no aparelho e não há. O único receptor de imagem dessa TV é o par de antenas embutido. Aqui fico a observar a tela, que já não pode receber minha imagens editadas, mas me apresenta um mar de ruído em movimento. Observo. Não entendo bem o que acontece, não sei precisar por quanto tempo, mas fico observando o ruído e alterando seus controles possíveis, novas formações de ruídos surgem, são oceanos de chuvisco novos. Fico preso nessa observação-mergulho numa consciência passiva de qualidade. Esse ruído que tantas vezes é mimetizado em filtros nostálgicos para aplicação em arquivos digitais se apresentava ali, projetado em cones preto e branco numa tela CRT.
Procuro mais sobre o tipo de onda transmitido no processo analógico e os motivos de sintonizar resquícios de rádios distantes. Descubro então que 1% do chuvisco captado naquela TV é basicamente o brilho de luz que preenche o universo, caindo na Terra de todas as direções com intensidade quase uniforme. Essa radiação cósmica é a luz mais antiga que podemos ver – o mais distante no tempo e no espaço que podemos olhar. A luz que partiu há mais de 14 bilhões de anos, muito antes da Terra ou mesmo de nossa galáxia existir. É essa espécie de relíquia da infância do universo que ali se materializa. Não seria esse um ruído ancestral?
Todas as imagens originais recuperadas foram retrabalhadas de forma a garantir o anonimato de seus proprietários. Caso reconheça alguma imagem de sua autoria e não tenha mais acesso ao conteúdo desse HD, entre em contato no desertodeerros@gmail.com. Ficaremos muito satisfeitos em devolver suas imagens e memórias.